quarta-feira, 21 de outubro de 2009

História de uma Espiga

História de uma Espiga

Num campo de trigo, havia milhares de espigas. Umas eram altas e esbeltas, outras grossas e baixas, e outras nem altas nem baixas nem esbeltas.
O Verão já avançado e o s l começava a dourar a seara. As espigas sonhavam com o fim do seu amadurecimento.
Um dia de muito sol, falavam entre elas desse jeito que só as espigas sabem falar:
- Eu – dizia uma espiga esgrouviada – já estou morta por amudurecer de uma vez, para ver se posso ir por aí de turista. Adoro ver coisas: montes, lagos, pessoas...
- Pois eu não – interrompeu ma espiga anafada. Do que eu mais gosto é de ficar à sombra a dormir, dormir muito, dormir toda a noite e todo o dia... e que ninguém me incomode.

- Ora – interveio outra espiga. Não percebeis nada... Não conheceis as ambições dos homens. Se eu pudesse, ia para a cidade e montava uma loja para lhes vender coisas, e assim ia me fazendo rica, pouco a pouco, com os dinheiros, dos homens.
- Pois isso não é nada – acrescentou uma quarta. A mim, que, como sabeis, tenho bom corpo, gostaria imenso de ser modelo e aparecer em todas as revistas e ganhar o concurso de Miss Espiga.
E, ao dizer isto, a espiga vaidosa baloiçava graciosamente de um lado para o outro, afim de que a sua beleza chamasse a atenção.

Todas foram falando e, ao mesmo tempo, riam-se das imaginações das outras e metiam-se com elas sobre o que lhe ia acontecer.
- E tu não falas? – disse a rapariga esgrouviada a uma que tinha o caule mais pequeno do que as outras, mas que estava repleta de grãos.
- Eu? Eu não falo, mas estou a ouvir.
- Tu também tens que nos dizer o que queres ser.
- Isso, isso! Tens que dizer - Gritaram todas!
- Já que temais, vou dizer. Eu, do que gosto é de ser espiga.
- Mas que parvoíce! Disseram algumas.
- Parece parva! Comentavam outras.
- Deixai-a explicar – pediram as mais sensatas.
-Disse que quero ser espiga e não retiro o que disse – afirmou a espiga de caule pequeno com uma vozinha muito doce. Deus fez-me espiga e espiga quero ser toda a vida, com todas as consequências. Deus não me criou espiga para fazer turismo, nem para dormir a sesta, nem para ganhar dinheiro, nem para me mostrar... Deus fez-me espiga para matar a fome dos filhos de Deus, que são os homens.
Fez-se silêncio no trigal e todas as espigas que empinavam nos seus caules para ouvir bem. A espiga atarracada, ao notar no silêncio que a escutavam, continuou:
- Sabeis qual é a melhor coisa que se pode fazer a uma espiga? Minhas amigas, a melhor coisas que podemos fazer é amudurecer bem... É quando, dentro de alguns dias, vier o homem buscar-nos, deixar-nos cortar... E, depois, ir para o moinho e entregar nele, com alegria, os nossos grãos. E deixar-nos moer para transformarmos em pão... porque no mundo há muitas crianças e velhinhos que não têm de comer... Por isso, eu estou muito contente por ser espiga e nada mais do que espiga.
Nenhuma das espigas do trigal de atreveu a falar. As palavras da espiga atarracada causaram-lhes impressão: deram conta de qe tinham sido umas egoístas. Agora, compreendiam que o melhor era ser espiga. Por isso, pouco tempo depois, começaram todas a agitar a cabeça em sinal de que aprovavam e felicitavam a espiga de caule baixinho.

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